Maio 18, 2024
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Phèdre foi doada para a igreja quando muito novinha, porque nasceu defeituosa: ela tem um ponto no branco dos olhos que é considerado suficiente para que ela não seja casável. O reino é Terre d’Ange, onde todos são descendentes dos anjos do céu, literalmente, e onde todos idolatram a beleza. A religião é a de Elua, o profeta filho de Deus que desceu à terra para pregar “ame como quiserdes”. Em Terre d’Ange, toda forma de amor é válida e aceita, desde o casamento heterossexual até a prostituição, que é vista como profissão de luxo e ligada à igreja de Namaah, prostituta que foi perdoada por Elua, casou com ele e ajudou-o a fundar o reino de Terre d’Ange.

Então no caso Phèdre é doada justamente para a igreja de Namaah, em que seus discípulos defendem toda forma de amor e onde as sacerdotisas são cortesãs. Ainda por cima, o pontinho no olho de Phèdre revela que ela é uma das escolhidas de Kushiel, o anjo da dor e da punição, e por isso para ela toda forma de dor leva ao prazer.

Quando ela termina seu treinamento, Phèdre é adotada por Anafiel Delaunay, um nobre de bastante influência. Ela passa a viver na casa dele, e aprende toda forma de habilidades para poder ser excelente na sua profissão: espiã para Delaunay, que a envia para satisfazer colegas e desafetos ao mesmo tempo em que a usa para conseguir informações sobre a situação política de Terre d’Ange.

A primeira parte do livro já é extremamente envolvente, contando o início da vida de Phèdre na igreja de Namaah, passando por treinamento com Anafiel e sua apresentação na corte. Mas aí acaba o primeiro terço da história, tudo muda de forma drástica e Phèdre vai parar na terra dos bárbaros do norte, onde ela vai precisar de todas as suas habilidades para sobreviver.

Kushiel’s Dart é um livro difícil de se descrever. É um livro de personagens bem desenvolvidos, cenas de ação empolgantes e um enredo inteligente. Mas também é um livro cheio de cenas de sexo pesadas, com uma ideia religiosa polêmica permeando tudo e um mote – “ame como quiser” – que pode parecer bastante escandaloso para muitos leitores. E, para completar, a protagonista é uma cortesã-espiã-sadomasoquista numa França de fantasia da época renascentista. É um tema que não é muito fácil de desenvolver, e que nem todo mundo vai se sentir à vontade para ler.

Não cheguei a ficar surpresa por ter gostado do livro, porque já tinha visto gente que eu acompanho falar bem; o que me surpreendeu foi a qualidade de tudo! Caracterização, ambientação, motivações, para não falar na trama em si, são da melhor qualidade. A autora escreve muito bem, os personagens são marcantes e a história é envolvente.

Os coadjuvantes também são devidamente incríveis: Melisande, uma nobre lindíssima que é crush eterno de Phèdre; Joscelin, um monge celibatário bonitão; Waldemar Selig, o líder das tribos do norte que quer invadir Terre d’Ange; Hyacinthe, um moço cigano amigo da Phèdre; Anafiel, o nobre que resgata Phèdre do orfanato e ensina a ela a arte da espionagem.

A escolha de ter a narrativa em primeira pessoa, por mais que seja comum em livros de fantasia ou eróticos, fez a história ficar mais interessante e empolgante porque o leitor fica de fora das intrigas palacianas e conspirações entre governantes que fazem o pano de fundo da aventura, já que estamos cientes apenas do que Phèdre tem acesso. Além disso também é refrescante, num mundo em que os romances eróticos tem a mania de colocar como protagonistas moças virgens apaixonadas por conquistadores bonitões, ler a voz de uma cortesã que tem interesse em transar com 100% dos personagens que aparecem na frente dela.

A autora não perde a mão em momento algum, nem nas cenas eróticas com sadomasoquismo, nem nas batalhas épicas em que Phèdre sempre consegue se enfiar. É uma leitura ágil e emocionante, com reviravoltas dignas e personagens memoráveis.

Recomendo fortemente, com o adendo do alerta de que possui várias cenas eróticas e com temática BDSM.

Kushiel’s Dart (2001) de Jacqueline Carey. Kushiel’s Legacy, Livro 1

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