Maio 19, 2024
Home » Mistborn: Nascidos da Bruna – O Império Final | Brandon Sanderson

Aventura de fantasia em um cenário bem bolado com um sistema de magia muito original. Em um mundo assolado por chuvas de cinzas, uma etnia padece sob uma escravidão de centenas de anos. Liderados por um ladrão que conseguiu escapar do campo de extermínio, um grupo de rebeldes se reúne para tentar derrubar um império milenar. Em comum, eles possuem a habilidade da alomancia, a magia dos metais, e a inegável admiração que sentem por seu líder.

Vin faz parte de um grupo de ladrões na capital do Império Final, Luthadel. Magra, pequena e acostumada a andar encolhida, Vin não parece ter seus dezesseis anos. Se ela fosse uma garota normal, ela já teria sido vendida para os prostíbulos há muito tempo. Mas Camon, o ambicioso e violento líder da gangue a que ela pertence, precisa muito das habilidades de Vin e não tem intenção de deixá-la longe da sua vista, mesmo que ele desconte toda sua frustração nela na forma de constantes espancamentos.

O irmão de Vin a deixou para trás depois de fugir da cidade, e ela não conseguiria se virar sozinha: sem dinheiro, e pertencendo à raça inferior do reino, os perpetuamente escravizados skaa, ela sabe que a rotina com o grupo de Camon é o melhor que poderia ter. O poder de Vin, que ela mesma chama de “sorte”, consiste em dar leves “empurrões mentais” nas pessoas, para que elas façam o que Vin quer. É muito leve e muito difícil, e Vin só tem uma certa quantidade minúscula de “sorte” por dia, mas é o suficiente para influenciar vítimas potenciais do grupo de Camon e manter a importância de Vin no grupo.

Kelsier é um mestiço: filho de pai nobre e mãe skaa, ele é seria perseguido pelos inquisidores do Império Final apenas por isso – mas Kelsier tem um currículo perigoso que o coloca na lista dos procurados de forma célebre. Kelsier era o maior ladrão skaa que já existiu. Capturado pelos inquisidores, ele foi enviado para os Fossos de Hathsin, a prisão de trabalho forçado de onde nenhum skaa saía vivo. Pois bem, ele saiu. Mas ele saiu diferente. E agora quer vingança por tudo o que o Lorde Supremo o fez sofrer – algo que ele pretende conseguir usando não só suas novas habilidades como também um grupo bastante capacitado de ladrões de alto nível. E Vin, mesmo sem saber, é uma peça chave para essa operação, pois ela é logo recrutada pelos ‘rebeldes’ quando a reconhecem pelo que realmente é: uma mistborn.

Se tem uma coisa que a nobreza faz questão de esconder dos skaa é a ‘alomancia’. Alguns nobres conseguem ingerir uma certa quantidade de um metal específico e digeri-lo para adquirir certas habilidades – como força e sentidos sobre-humanos, distinguir e controlar metais, acalmar e inflamar emoções. Esse poder não existe entre os skaa e é hereditário entre a nobreza, fazendo com que qualquer mestiço deva ser morto (ou, no caso mais comum e cruel, fazendo com que todo o nobre que se aproveite de uma moça skaa tenha a obrigação de matá-la depois, para evitar que ela tenha filhos). Os que conseguem controlar um metal são mais ou menos comuns entre a nobreza, e são chamados de mistings (algo como “neblinosos” na minha tradução muito livre), mas os que conseguem controlar TODOS os metais são muito raros, considerados importantíssimos e tratados quase como reis pelas casas nobres às quais pertencem. Kelsier é um desses – e Vin também. Eles são chamados de Mistborn (nascido da bruma, no caso) e, quando estão usando a capa e capuz cheia de firulas, são deixados em paz por todo mundo que os vê – até pelos malignos e super-poderosos inquisidores.

Enquanto os planos para destruir o governo começam a rolar, Kelsier vai ensinando as regras da Alomancia para uma Vin desconfiadíssima, e quando ela começa a se perguntar qual vai ser o papel dela no esquema maior das coisas, logo descobre que querem que ela seja uma espiã para o grupo: se fingindo de nobre durante as infindáveis festas na capital para descobrir como andam as alianças entre as casas da nobreza. É em uma dessas festas que ela conhece Elend, herdeiro da casa mais poderosa, que por acaso também é um garoto pouco convencional, convencido de que nem tudo é perfeito no Império Final e bastante avesso às etiquetas maçantes da nobreza. E Vin começa a se perguntar se Kelsier está certo de achar que todo nobre merece morrer.

Eu gostei muito desse livro. Com ambientação interessante, um sistema de magia muito original e personagens cativantes, eu mal consegui tirar os olhos da história, mesmo sendo longa (passa das 500 páginas). Gostei que o ponto de vista muda dependendo do capítulo, dando ao leitor maior senso de suspense. Gostei que a história começa como um planejamento entre amigos – tipo Ocean’s Eleven – mas na verdade eles estão planejando derrubar um regime político que existe há mil anos. Gostei que Vin, apesar de tecnicamente ter a “idade difícil” de protagonistas, é uma personagem complexa que cresce e tem profundidade. Gostei da ambientação política e paisagística: um mundo governado por uma entidade-Deus, controlado por ‘reguladores’ e ‘inquisidores’, escravocrata e violenta; um mundo onde o sol nasce vermelho, cinzas caem do céu o tempo todo, as árvores nascem com folhas marrons e espectros de neblina assolam os arredores das cidades, se alimentando de corpos. E gostei especialmente do ‘sistema de magia’ do mundo do autor: allomancy, o poder de ‘queimar’ metais. E gostei ainda mais do ‘protagonista secundário’ (porque é óbvio que Vin é a protagonista). Kelsier é o máximo. Otimista, cheio de piadas, incapaz de admitir derrota, sempre com um sorriso no rosto… ele é o líder nato do qual todos desconfiam, e um personagem muito divertido de se ler.

A questão que faz o livro ser menos do que ótimo é a problemática ao redor de uma “raça” escravizada por mil anos; onde as mulheres são obrigadas a se prostituir, as crianças mestiças são assassinadas, e os escravizados são infelizmente lentos e burros demais para saírem dessa situação. Dá pra entender que o autor quis fazer uma ambientação muito maligna mesmo e não parou pra pensar no que significa um grupo ser escravizado por mais de mil anos sem se rebelar por serem inferiores e a forma como são tratados é a mesma que um grupo étnico real foi tratado na vida real por pessoas reais. Existiram diferentes tipos de escravidão ao longo da história, mas ele escolheu a mais próxima da nossa realidade como base para sua ficção. Me parece o típico autor branco que quis fazer o rolê épico e quis inovar com a menina sendo chosen one, mas não foi até a página dois porque nunca pensou nisso já que nunca precisou. Eu acredito que ele até pode tentar querer explicar a escravidão com alguma coisa mágica; e provavelmente quis colocar os rebeldes como sendo únicos e o vilão como super poderoso justamente para aumentar o poder dos protagonistas. Mas o papel do autor é justamente ser criativo para inventar o mundo secundário sem precisar brincar com estereótipos que ainda causam dano hoje.

Mistborn – The Final Empire (2006) de Brandon Sanderson. Série Mistborn Livro 1

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